Há 250 anos que o "Fonfon" tem nome científico

Como já é do vosso conhecimento pelo artigo (Kutum Ben Ben, dan papa pan dau leti...) que publiquei em Março 2008, desde cedo tive uma paixão pela entomologia, pelo que, além de estudar os insectos da terra, fazia colecção deles. Este gosto adveio da leitura (aos 11 anos) do livro "o Mundo dos Insectos" da colecção Ver e Saber da Verbo.

Um dos insectos que mais me apaixonava observar era o Fonfon, uma espécie de vespa de amarelo e preto que faz "casa-fonfon" de "papa-lama" pelos cantos dos quartos e debaixo dos móveis das nossas casas. Voltarei a este insecto daqui a pouco. Porque me lembrei então de falar dele? Eis a razão:

Estive hoje a arrumar as velharias que guardo e deparei com a caixa de insectos da minha colecção (a que apresento nesta figura de 1972) em deplorável condição: o tempo (36 anos) desfez a maior parte dos insectos. De imediato resolvi fotografar o que da caixa restava: vejam a figura anexa. Reparei então no insecto ao lado esquerdo da borboleta e lembrei-me do bicho e da data de sua classificação científica: Agosto de 1758 por Lineu. Trata-se do Sceliphron spirifex Linnaeus 1758. Vale a pena comemorar estes 250 anos e partilhar convosco a efeméride e os pormenores que se seguem:

A mulher-a-dias (sampadjuda do Fogo com a proverbial mania do "cau limpo e fréscu") que vinha limpar-nos a casa todos os Sábados, Lia Baptista de Sousa de seu nome, fartava-se de barafustar contra os fonfons que lhe tornavam a tarefa mais difícil, tal a sujeira deixada pelos ninhos de barro que aqui e ali implantavam. Olhava-me de soslaio quando lhe implorava para não destruir, pelo menos um desses ninhos, pois queria eu observar o evoluir da construção. De facto era algo maravilhoso seguir o trabalho destas vespas solitárias:


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  • Em seguida, o nosso fonfon carrega a bola de lama até ao sítio onde pretende construir o ninho e começa a trabalhar essa bola em anéis que irão formar células oblongas. Enquanto faz este trabalho emite um som típico: fon-fon-fon-foooon-fon, donde o nome onomatopaico que lhe deram aqui em Santiago. No Fogo "fonfon" é uma outra vespa e o nosso querido Sceliphron spirifex é em São Nicolau conhecido por "bananinha séca". NB: no Fogo o Sceliphron spirifex é conhecido por "custon fagássa".
  • Á medida que o fonfon termina uma célula, deposita dentro um ovo e vai à caça de aranhas saltitonas (os "cachorrinhos-lau-lau" por exemplo) e outras pequenas aranhas que caça sem piedade. Enche as células dessas aranhas vivas, mas por ele paralisadas (comida para o filhote) e tapa com lama.
  • Começa então a construção de uma nova célula. As células se empilham umas em cima das outras formando a tal casa fonfon que bem conhecemos. Como faz uma célula de cada vez, vai à caça e começa uma nova célula, muitas vezes não encontra a lama no mesmo sítio e a casa (ninho) tem várias cores (fazem-me lembrar algumas construções aqui do burgo).
  • Se quebrarmos uma destas casas, encontraremos células com as tais aranhas e com larvas de fonfon em diferentes estádios de metamorfose. É muito engraçado observar a reacção do fonfon quando regressa e encontra o ninho danificado: faz um ruído "fonfónico" estridente (como quem manda à pqp) e esvoaça desairado à procura do vândalo (é observar de longe, não vá a vespa ferrar o observador; mas o bicho não é agressivo). E depois se estranha que um insecto tenha... sentimentos!

Há uma outra espécie de fonfon em Cabo Verde que em vez de aranhas caça lagartas. Estes fonfons, são negros de antenas laranja e também fazem ninhos de barro. Esses ninhos são redondos (mais parecem igloos esquimós) e eles os dispõem uns ao lado dos outros.

Sem esquecer de mencionar os aspectos ecológicos das vespas, como os da luta integrada contra as pragas agrícolas, termino, remetendo-vos para uma página francesa com belas fotos do fonfon, que eles chamam de pélopée tourneur. Vejam mais fotos deste himenóptero: fonfon, vespa-oleira (em Portugal) ou também guêpe maçonne:
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publicado por jorsoubrito às 18:10 | link do post | comentar