Histórica moeda entre o desprezo e o menosprezo

Esta é a primeira moeda que levou o cunho de Cabo Verde. Foi posta a circular em 1930 (Decreto nº18495 de 24.I.1930) e a sua tiragem foi de um milhão de exemplares.

Já se aperceberam, meus caros leitores, que vou finalmente falar de Numismática. O que vos parece obscuro é talvez o enigmático título. Porém, lá chegaremos, mas não sem antes conhecermos melhor a história desta moeda e de como me deparei numismata.

Rapidamente podem encontrar na Wikipédia, uma conseguida explicação do vocábulo e de seu significado. Eis o primeiro parágrafo da referida explicação:
"Numismática (do grego clássico νόμισμα - nomisma, através do latim numisma, moeda) é a ciência auxiliar da história que tem por objetivo o estudo das moedas e das medalhas."
Na casa onde cresci (e onde moro: localizem-na no pano de fundo do cabeçalho deste blog) há um vasto alçapão onde na época minha avó mantinha baús e velharias do século XIX, quiçá, XVIII. Curiosidade infantil, aliada à minha nativa tendência para a investigação, levava-me a fazer incursões exploratórias ao alçapão, em busca de não sei que tesouro escondido. Acreditem, encontrava coisas fabulosas e um belo dia desencantei umas antigas moedas do tempo da monarquia (vinténs, patacos, "derés" e outras) entre as quais se destacava um D. Luís de prata! Este foi o rastilho e a energia de activação da minha entrada para o grupo dos numismatas! (to be continued...)

Agora vejamos um pouco da história da primeira cunhagem de moedas próprias de Cabo Verde, com o nome da então colónia devidamente evidenciado. É com a devida vénia ao Eng.º de Sistemas Fernando Rodrigo C. Romão e Alves da Silva que transcrevo o seguinte texto de um site seu:

As moedas de Portugal e as que se obtinham com o comércio externo compuseram desde a origem a numerário desta Província.

LOPES FERNANDES, na sua Memoria das Moedas Correntes em Portugal, descreve o que se passava na sua época, já no século XIX. "As moedas do reino são correntes nesta província, 1 peça de 8000 réis ou 8 Patacas e 1/3, os Cruzados novos de prata, na venda por 500 réis, e na compra por 480 réis, sendo elles e as peças raríssimas; e também correm as fracções de prata. O cobre e o bronze, as mesmas que em Portugal. São admitidas todas as moedas estrangeiras, com o valor de mercado, como qualquer outra mercadoria; mas nas transacções com os estrangeiros a moeda nominal é a Pataca com o valor de 800 réis fortes; e na Ilha da Boa-Vista existe a mesma moeda nominal, e mesmo nas transacções internas, nas quaes é a Pataca reputada por 800 réis fracos - Foi esta informação dada para o Governo pelo Governador Geral de Cabo Verde em 16 de Fevereiro de 1846.

O Decreto de 19 de Outubro de 1853, mandou que todas as moedas portuguezas fossem alli correntes, sendo igualmente admittidas todas as estrangeiras, que o foram em Portugal pelos Decretos de 1846 e 1847".

ÁLVARO LERENO, in Subsidios para a História da Moeda em Cabo Verde (1460-1940), fala das vicissitudes suportadas neste território por esses anos fora sem moeda própria e, geralmente, com escassez da que lhe vinha da Metrópole, de Angola e dos estrangeiros com quem negociava.

É com o Decreto nº18495 de 24.I.1930, que aparece a primeira moeda metálica desta Província Ultramarina.

Vejam agora a belíssima série numismata de 1930:
1 Escudo

1930
AlpacaAmoedação

50,000
50 centavos

1930
AlpacaAmoedação

1,000,000
20 centavos

1930
BronzeAmoedação

1,500,000
10 centavos

1930
BronzeAmoedação

1,500,000
5 centavos

1930
BronzeAmoedação

1,000,000

É pois esta última moeda que hoje vos apresento:
O MEIO TOSTÃO
A moeda com que não se conseguia comprar quase nada, sobretudo durante a II Grande Guerra e anos subsequentes (a inflação galopante desvalorizou a moeda). O meio-tostão tornou-se "cascalho". Devido a isto, a sabedoria popular tratou logo de engendrar duas frases paradigmáticas:

A de desprezo:
"Ca bali nen mei tiston frado"
Um indivíduo ou um objecto desprezível "não valeria nem um meio-tostão, e menos ainda se esta moeda estivesse furada!"
NB: não é que eu furei uma destas moedas para tê-la no bolso e poder gozar com os colegas que se metiam comigo, dizendo-lhes que a moeda era mais valiosa do que eles!!
A de menosprezo:
"Mei tiston ca ten troco !"
A uma provocação não se deva responder (dar o troco) sobretudo se vier de alguém que desconsideramos. De facto não havia troco para a moeda de menor valor facial, a de 5 centavos, o nosso meio tostão.

publicado por jorsoubrito às 01:11 | link do post | comentar